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quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Entre a caridade e a prudência



Fui criada numa família muito simples com dificuldades até, mas dentro dos padrões cristãos. Compartilhávamos o pouco com vizinhos e amigos. A ajuda também era mútua em ocasiões de doenças ou partos. Nas longas prosas da tarde no portão trocávamos experiências e quando caía a noite procurávamos  no céu coalhado de estrelas as Três Marias e nos deliciávamos com as imagens da lua tentando decifrar o terrível dragão. Era divertido dormíamos cedo ( não tínhamos TV)não sem antes fazer a oração e pedir a bênção dos pais.

Na ampulheta o tempo corre devagar, mas implacável. Quantas mudanças na política, na economia na oportunidade para todos. Mais comida na mesa, as necessidades aumentam na medida em que a  tecnologia avança. Mas, no país imenso abençoado por Deus como diz o poeta, com a costa maravilhosa, florestas, cachoeiras, rios imensos, variedade de clima, tempestades e rajadas de vento como os camicases avançam sobre nós tisnando nossas esperanças. Não são fenômenos da natureza, pois até nesse quesito fomos abençoados. São rajadas de metralhadoras, de impropérios de incompetência, de desmandos, da roubalheira, de conivência com o crime que é “mais organizado” que nosso governo. E aí perguntamos: — Como ficamos nós no meio desse fogo cruzado? O noticiário dos meios de comunicação são recheados de notícias escabrosas  de crimes hediondos e discussões abstratas  de defensores e acusadores sempre no tom  meio palanque meio sacristia em  uma arenga sem fim que não se converte em resultados..

Não sabemos em quem confiar, não divisamos que futuro esperar, desolados, sós,  deparamos-nos com a bandidagem e insegurança, não olhamos no olho de ninguém ao nosso lado. Todos se nos parecem inimigos, algum lobo à espreita da presa. Infelizmente já nos acostumamos com a morte ao nosso lado como uma sombra que passa,  só a dor não passa. Gestos simples de gentileza há muito foram esquecidos “é cada um por si”. Vivemos entrincheirados prontos para a defesa e o ataque. Escondidos debaixo do tapete os nossos preconceitos enraizados e vez em quando mostram suas unhas polidas mesmo  que sutilmente.

Falar sobre isso nem vem o caso agora nem haveria espaço para tanto. O que pretendo relatar é uma experiência por mim vivida que deixou aflitos meus familiares considerando meu gesto imprudente demais para os moldes de hoje não sem razão pois algumas experiências vividas foram muito dolorosas.

Estacionei o carro em frente ao Pet Shopping, desci com a bolsa a tiracolo em minha cadela nos braços ansiosa para o banho por conta do sol escaldante e o calor insuportável. Agachado rente ao muro um rapaz aparentando menos de trinta anos  logo se dirigiu à mim pedindo ajuda. Arrepiei-me toda antevendo um assalto. Tinha ele um pequeno celular às mãos estava de chinelo, bermuda e um boné trajes comuns que estamos acostumados ver nas ruas também nos noticiários. Todos têm a mesma cara e  “ninguém traz estrela na testa” como diz o ditado. Diante do impasse fiquei sem saber o que fazer com minhas ideias brigando entre a desconfiança e o coração. Este falou mais alto. O rapaz queria ajuda  porque precisava ligar para o senhor cuja casa ele estava em frente e para qual havia trabalhado. Tinha um cartão nas mãos com um número de telefone, mas não conseguia ligar do seu pois estava sem crédito e o morador não estava em casa. 

Angustiada na luta interna abri minha bolsa, pequei meu celular e com ela aberta e a cachorra no colo com dificuldade vi o número e disquei. Realmente quem atendeu foi o senhor que ele havia falado e pediu que o esperasse que logo estaria ali. Ficou muito feliz e agradeceu muito, brincou com minha cachorra e nos despedimos. Ufa, que alívio mas dentro de mim o remorso por ter  a princípio desconfiado. O Evangelho nos ensina a amar o nosso irmão como a nós mesmos mas também que “A caridade não dispensa a prudência” e ficamos nós nesse turbilhão de sentimentos desencontrados.

Mesmo assim ainda acreditamos na justiça dos homens que embora lenta e meio manca está fazendo seu trabalho mas muito na Justiça Divina, essa sim, implacável e com certeza, haveremos de ver reinar a reorganização e reconstrução desse país maravilhoso chamado Brasil.


Geni    21/01/2016


Um comentário:

  1. Caríssima Geni,
    Vivemos dias de muita insegurança, portanto caridade tem que ser acompanhada pela prudencia.
    Vera Gracia

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