Postagens populares

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Retrospectiva


Mulher linda, vestida elegantemente porém muito discreta, olhos meigos e brilhantes, belas curvas que mantém ainda em um corpo esguio, chama a atenção na sala de espera de um consultório médico especializado em exames clínicos e diagnósticos. No terceiro mês de gestação, Maria Cecília aguarda ansiosamente pelo ultrassom que vai finalmente revelar o sexo do bebê. Enquanto isso, observa as colegas de gestação, tentando adivinhar a sensação de cada uma.
Vem-lhe à lembrança uma imagem chocante do noticiário do dia anterior: uma mãe deu à luz um garoto no meio dos escombros e de corpos putrefatos na terrível tragédia deixada pelo violento tufão nas Filipinas. Seu pensamento confuso lhe traz um enorme aperto no peito. Mesmo sem seu consentimento, vêm-lhe à mente imagens de nossas pobres crianças vítimas do desprezo de famílias desestruturadas e que, vivendo na promiscuidade, são presas fáceis de todo tipo de gente. Seja por falta de trabalho, de educação, ou de perspectiva, as crianças tornam-se alvos fáceis para a exploração no trabalho escravo, na prostituição, na mendicância... Isso quando não são deixados em banheiros públicos ou em latas de lixo.
Retorna de seu devaneio e se incomoda com a demora no atendimento precário, mesmo para ela, portadora de plano de saúde cujo elevado custo nem de longe se transforma nas vantagens oferecidas. Agora é a precariedade dos serviços essenciais que toma seu pensamento e lhe eleva o grau de tensão. Como será no futuro, quando o filho crescer?
Escolas que mudam constantemente seus métodos de ensino sem qualquer resultado prático, professores desmotivados e mal preparados, violência de todos os naipes, no bulling, nas brigas constantes, nas imagens postadas nas redes sociais. Armas nas mãos de jovens que não sabem escrever, mas que as ostentam como se troféus fossem. Ideário defendido pelos black blocs, que se autodenominam rebeldes sem causa e ferem a democracia do país; ídolos milionários fazendo apologia do sexo, dinheiro e poder.   Ídolos de areia adorados e imitados pelos adolescentes na falta de bons exemplos. Adultos infantilizados, presos à ditadura da beleza artificial imposta pela mídia, terceirizam a educação dos seus filhos, entregando-os a instituições pobres de valores morais e éticos, e que dão baixo valor à vida humana.
Sente que começa a se exaltar. 2013 está sendo um ano difícil. Nosso país está doente: legislação deficiente, fiscalização e punição inexistentes. Maior escândalo da história envolvendo políticos no maior esquema de corrupção. Um julgamento que se arrastou por longos oito anos deixa o amargo gosto da decepção.  Os três poderes enfraquecidos por transações espúrias escondidas no subsolo da corrupção e da impunidade. Enquanto isso, as tragédias se repetem: crimes hediondos, desastres ecológicos. Movimento desorganizado e desconexo de grupos isolados na defesa de seus interesses mercadeja tráfico de influência na base de quem pode mais chora menos. A polícia nada pode fazer ou atende a outros interesses que ela não consegue entender. A justiça? Lenta, nas poucas vezes em que se faz presente. Os pensamentos lhe trazem um sentimento de angústia, tristeza e impotência. Urge repensar essa condição de acomodação sem adotar a histeria do politicamente correto. Mas como?

A voz da recepcionista interrompe seus devaneios. É sua vez, finalmente. Ansiosa e feliz, esquece os pensamentos que a incomodaram para acompanhar o exame na sala fria e de pouca luz. Cena linda ver na tela do computador: seu bebê se movimentando na abundância da vida. É um menino e se chamará Emmanuel. “Deus conosco”, ela se lembra do significado do nome, escolhido com todo amor, caso fosse menino. Com certeza crescerá em país melhor, pensa.  

Feliz pela tão ansiosamente aguardada notícia, volta para casa, coração sereno. Sua cabeça agora é só pensamentos bons. Novas imagens povoam sua mente. Meu filho conhecerá esse país modificado, pensa. Esse país em forma de coração de proporções continentais que tanto ama, abundante em áreas verdes e água potável, que mantém a unidade nacional apesar de seus representantes. Esse país gigante que acorda e exige seus direitos à vida e a uma educação ampla e abrangente, pois finalmente reconhece que é através da educação que haverá competência e lucidez na hora do voto capaz de transformar o destino de um povo.

Essa é uma realidade possível, pensa. Temos a nosso favor muitas riquezas, povo pacífico e trabalhador, tecnologia avançada no auxílio à ciência e pesquisas. Precisamos somente de líderes novos, com novas propostas para mudar a imagem deste país. Um país que tenha os melhores do mundo não somente no samba e no futebol, mas em crescimento econômico, tecnológico, educacional. Líderes que, com certeza, não se envergonhem de suas biografias; pelo contrário, que as tenham como exemplos para as futuras gerações. Seja bem-vindo, Emmanuel!

Geni Bizzo 19-11-2013


Poetrix escritos com base em experiências do cotidiano.




 






 


   Rasgam-se fotos                                        
   Faxina da alma                              
   Lembranças amalgamadas

   Tempo implacável
    Mudança de cenário
    Lembranças resistem

    Fotos amarelecidas
     Ressuscitam o tempo
     Sonhos inconfessáveis

     Drone avariado
      Libera sonhos, esperanças
      Estratosfera cinzenta

VELÓRIO
   Ambiente  monástico
    Rostos sem expressão                                                    
    Finitude, reflexão

NOTÍCIA
   Devassando arquivos
    Histórias  desenterradas:                                                                     
    Humanidade agradece

Geni       19-11-2013



terça-feira, 12 de novembro de 2013

Desenlace/Enlace



A multidão vai à loucura, a poeira levanta. A baba espumante do boi se mistura à terra vermelha. No corcovear cheio de ódio um milagre acontece.  Soltam-se as amarras. No desenlace, a vitória do animal antes indefeso. O peão beija o solo experimentando a derrota.

Pipas colorem o céu encantando as pessoas que vibram no campeonato. O dia está lindo, o vento colabora e as piruetas no ar levam ao delírio os competidores mirins. Mas eis que um acidente acontece. Uma ave incauta perdendo-se do seu bando se junta àquelas que supõem suas novas amigas. Enrosca-se nos fios e imobilizada pelo seu debater, projeta-se no solo ofegante, O desenlace é difícil. A comoção é geral, mas felizmente tudo acabou bem e ela foi devidamente medicada, voltando para o seu espaço.

Limpe das gavetas da memória as velhas lembranças; afrouxe o apertado laço que o peito oprime.  No desenlace, mostre uma nova face que o sorriso revela cheio de esperança.

Desenlace os fios tricotados nas mantas intermináveis do tempo inexorável. Estão amarelecidos, ofereça aos pássaros que entrelaçarão nos seus ninhos. Tudo se renova no ciclo da vida.

Prende-me em seus braços. No emaranhado dos meus cabelos, minhas comportas desenlace. Deixe-me indefesa e que na correnteza das lágrimas na minha face o rubor nela realce.



Busque: o pôr do sol, o balé do beija-flor no jardim, o soar melancólico do sino da capela, o cantarolar do riacho, a prece na hora do Ângelus. Enlace com o arco-íris e ofereça a uma mãe que balança o berço. Uma nova aquarela surge. É a vida em abundância.


Um drone sobrevoa registrando o espetáculo: Braços entrelaçados num enorme círculo. Os pés batem com força cadenciada. As vozes em uníssono dão o ritmo. Índios na dança de agradecimento juntam-se à floresta, aos animais, aos deuses numa união simbiótica. Jaci contempla alumiando a cena. A tribo vestida com o figurino oferecido pelas aves e floresta agradece aos deuses a fartura que veio com a chuva. As horas passam céleres e o enlace dura até a chegada de Guaraci. Então os guerreiros exaustos retornam às suas ocas.

Geni - Oficina Literária 12/11/2013

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Observando a natureza



12 - E junto ao rio, à sua margem, de um lado e de outro, nascerá árvore que dá fruto para se comer...    Ezequiel 47:12

O sol mergulha seus raios, tingindo as águas no remanso do rio que corre sem pressa deixando para trás suas correntezas e redemoinhos. Sem pressa, mas incansável. O astro rei acompanha as águas nas margens, beijando os ingás que tombam seus galhos, oferecendo-se aos peixes que, no entardecer, empanturram-se no alimento farto. A chalana passa devagar, formando mansamente pequenas ondas quase invisíveis para não atrapalhar a paisagem. Aqui, o salto mortal de um peixe incauto abocanhado pela garça veloz, ali um jacaré se recolhe sorrateiramente assustado, acolá um bando de borboletas se agrupam alojando-se para esperar a noite que não tarda.
É a natureza repetindo-se. A noite chega para a alegria de muitos insetos e animais de hábitos noturnos, que se aproximam das margens cumprindo seu papel na cadeia alimentar. Na chalana alguns dormem acotovelando-se nas redes empoeiradas e rotas. Outros cantarolam baixinho para ninar as crianças, movimentando um pequeno galho no improviso de um leque para espantar os mosquitos. O calor intenso deixa a noite modorrenta. Um papagaio mordisca com seu beijo de boa noite a orelha do garotinho que, indiferente às leis ambientais, tem-no como seu brinquedo.
A viagem continua. O silêncio só é quebrado pelo piar de algum animal ou pelo som tonitruante de alguns que exageraram no calmante do álcool. Só o timoneiro não dorme. Atento, movimenta vagarosamente o leme com a responsabilidade no seu melhor dia de comandante da aeronave que vê nos seus devaneios.


Geni  09-09-2013

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Primavera com gosto de infância



O dia se espreguiça, acordando devagar. No terreiro, o balé das galinhas reverencia numa ruidosa algazarra o galo campina que, quando canta, muda de cor levantando a crista vermelha como fogo. A revoada de maritacas colore de verde-amarelo o azul anil do céu claro. Assim começa mais um espetáculo que a natureza apresenta todo dia, indiferente se há ou não público para aplaudir.
No quintal, o velho poço ainda fornece água para banhar a pequena horta. O sarilho geme enrolando a corda que traz a caçamba, sem pressa, num ritmo cadenciado, cantarolando enquanto faz seu trabalho. O calor, a luminosidade indireta e a constante umidade fazem brotar nas encostas dos barrancos as lindas avencas que se deliciam banhadas pelos respingos do vai e vem da caçamba.
As avencas são lindas, frágeis e de variadas espécies, admiradas como plantas ornamentais. As miudinhas são chamadas cabelo de anjo e carregam a fama de espantar mau-olhado. Outras são usadas na medicina como chás ou compressas.
Para mim elas representam a delicadeza e, a doçura, e me provocam uma sensação deliciosa, um fascínio que não consigo entender e, na impossibilidade de cultivá-las, pois o ambiente em que vivo não é propício (somente o lirismo de Chico consegue vê-las crescendo na caatinga) debruço-me na borda do poço para admirá-las.
Imagino a sensação que teria se pudesse tocá-las, acariciá-las como se Sininho fosse, mas me contento em observar minha imagem refletida no fundo do velho e cansado poço, sentindo em meu rosto no espelho d’água o respingar das gotinhas que elas me atiram balançando seus frágeis galhinhos. Divirto-me com as caretas provocadas pelas ondas formadas e ali me esqueço do tempo. Com o sol, alto volto à realidade com a certeza que na minha vida sempre será primavera!


Geni 23-09-2013

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Casamento - Simone e Gustavo



O que faz com que duas pessoas que se encontrem sintam-se tão atraídas uma pela outra que decidam unir suas vidas?

O amor faz isso. E o que é o amor, esse sentimento cantado em todas as línguas e formas de expressão, que sempre esteve em evidência na poesia, na música, no cinema, nas artes?
O filme “Suplício de uma Saudade” contou em sua trilha sonora com uma música que apresenta várias definições do amor. A canção, que tem como título “Love is a many splendored thing” (o amor é a coisa mais esplendorosa), canta ainda que “o amor é a rosa de abril que somente brota no início da primavera”, “o amor é a forma como a natureza se doa”, “o amor é a razão de viver”, “o amor é a coroa de ouro que faz um homem rei”...
Em resumo, o amor acontece (chega) no momento certo (como a rosa de abril) e é o motor (fator) de grandes transformações. E o amor é tudo isso e muito mais. Na Carta aos Coríntios, Paulo de Tarso, o apóstolo de Jesus, nos fala no Capítulo XIII a respeito do amor: “Se eu falar língua dos anjos, se tiver fé a ponto de transportar montanhas, se distribuir todos os meus bens e não tiver amor, nada sou”. E continua: “O amor é paciente, é benigno. O amor não é invejoso, não busca seus próprios interesses, não suspeita mal. O amor tudo tolera, tudo espera, tudo crê.”
Para o apóstolo Paulo, o amor pressupõe o cultivo da paciência e da tolerância na convivência e no relacionamento, para que as dificuldades possam ser superadas. Centrado na solidariedade, no empenho de tornar o outro feliz, o amor verdadeiro não é egoísta, pois não busca atender a seus próprios interesses.  E é esse amor que une Simone e Gustavo e nos traz aqui hoje, neste dia de festa, para comemorar e testemunhar a união dos dois.
Tive o privilégio de conhecer Simone há cinco anos, quando aqui cheguei, vindo de São Bernardo do Campo. E foi amor à primeira vista. Jovem, meiga, de olhar terno, batalhadora, profissional competente, firme em seus propósitos, mãe amorosa e sobretudo muito bonita. Por meio dela conheci Gustavo, um menino grande. Bom amigo, bom filho, bom profissional, muito amoroso e que se revela um grande companheiro para Simone. O encontro dos dois não foi casual. O acaso não existe e, como diz a canção, “devia estar escrito nas estrelas. 
A nós, testemunhas desse encontro feliz, nos cabe brindar. Brindemos, pois, esse encontro abençoando.
Simone e Gustavo. Na presença de seus pais, do filho e dos amigos, vocês selam hoje um compromisso. O amor, a cumplicidade, a união de vocês constituem o alicerce para o começo de uma nova vida.
Meus queridos. O tecido do convívio é feito de milhares de pequenas fibras. No entrelaçamento dessas fibras entram os componentes da família de ambos os lados. Pessoas diferentes, com objetivos, aspirações e interesses diferentes, que passam a formar de agora em diante outra grande família. Os laços de amizade serão  ampliados.
Mas também – e com certeza! – aparecerão arestas, que necessitarão ser aparadas. E esse é um trabalho de paciência e compreensão  mútua, sempre com o desejo sincero  de fortalecer esses laços e essas fibras. Muitos encontros festivos virão. A vida é um grande baile em que as almas se encontram, se abraçam, se conhecem...
Mas se esbarram também. E o final feliz depende da boa vontade de cada um.  Até porque, todos sabemos, nem tudo são flores em um relacionamento. Com o passar do tempo, as pessoas engordam, ganham rugas, perdem cabelos, adoecem. Aparecem dificuldades de todos os matizes. Esta é a realidade de todos nós. E com vocês não vai ser diferente. O verdadeiro amor, porém, consegue ultrapassar as barreiras da aparência e manter-se fiel à promessa de estarem juntos em todos os momentos: na alegria e na tristeza, na saúde e na doença.
Conhecemos a história de Christofer Riwer, O Super Homem.  Transcorridos os primeiros meses, quando o desânimo abateu sobre ele, sua esposa disse a frase marcante:  “Você ainda é você e eu o amo”. E foi a certeza desse amor que lhe deu forças e entusiasmo para grandes mudanças dentro e fora de si. Isso só foi possível graças aos ingredientes de uma convivência amorosa: tolerância, cumplicidade, fé  e, principalmente, amor.
Repetimos aqui Antoine de Saint-Exupéry: “o essencial é invisível para os olhos”. Que a rosa de abril que brota na primavera que chega daqui a algumas horas possa ser o símbolo do lindo amor que une vocês. Oxalá estejamos aqui, comemorando as bodas de prata. E por que não a de ouro?
Que Jesus, em sua infinita misericórdia, nos abençoe a todos e hoje, particularmente, ao casal que se une.

22-09-2007

Geni

terça-feira, 23 de julho de 2013

Uma história de sucesso


Estamos em 1991. Acabo de chegar à Escola Anésia Loureiro Gama, em São Bernardo do Campo. Egressa de uma escola distante com muitos problemas surpreendeu-me tudo o que aqui encontrei: da organização e limpeza até a disciplina reinante, tanto no grupo de professores, como no pessoal administrativo e, principalmente, nos alunos.
Por atribuição da direção da escola, fiquei responsável por uma terceira série do primeiro grau. Eram mais de 35 alunos (não me lembro do número exato), mas de imediato senti acontecer uma grande afinidade entre nós. Crianças na faixa de nove anos, cheias de vida e com muita predisposição para aprender. Fiquei entusiasmada, antevendo o sucesso que alcançaríamos juntos, uma vez que dar aula sempre foi o meu forte.
Particularmente, chamou-me a atenção uma garotinha linda, de olhos vivos e muito espertos, que participava ativamente de todas as atividades, colocando-se muito bem nas perguntas e nos questionamentos. Com a desenvoltura de uma pessoa adulta, sabia ocupar seu lugar, conquistando a simpatia da classe. Com isso, estabeleceu desde o início uma ligação muito grande com a professora.
Mesmo não tendo formação específica em Língua Portuguesa, sempre adotei o lema de Oscar Wilde, de que ‘”para se escrever, basta ter alguma coisa para dizer”. Gostava de trabalhar a criação de texto, coisa que fazíamos com bastante frequência e com grandes resultados. Incentivava a leitura e estimulava a que os alunos se arriscassem no mundo mágico da escrita. Com eles, soltava as amarras da imaginação e voávamos juntos nas asas dos nossos sonhos. Acompanhei a classe no ano seguinte, quando terminou a primeira fase do primeiro grau. E lá estava ela: Luciana Bugni.
Ainda hoje me vem à memória o quanto era prazeroso ler seus textos. Surpreendia sempre a forma como desenvolvia qualquer tema que trabalhássemos. Tinha idéias próprias, e as trabalhava de forma coesa e precisa. Na correção dos textos, sempre tive o hábito de fazer alguma observação que ultrapassava a convencional correção ortográfica e gramatical. Ela deve lembrar-se de algum comentário meu. Coisas como: “um dia vou ver algum trabalho seu... você será escritora, eu pressinto... que delícia de história, continue nesse caminho...”.
Sinto enorme prazer em ver confirmado meu vaticínio. Está aí Luciana, jornalista cheia de beleza e de vida nos seus 30 anos. Pelo caminho que tem trilhado, estou absolutamente convencida de que seu futuro será ainda mais brilhante. Parabéns pelo aniversário, pelas conquistas e pela grande beleza revelada pelos seus lindos olhos.

Carinhosamente, Geni

09/2012

nota: Escrevi esse texto a pedido de sua mãe quando a empresa prestou uma homenagem para Luciana no seu aniversário.


terça-feira, 16 de julho de 2013

MUITO ALÉM DO AMOR


Sandra e Sérgio- pais da noiva
Muitas são as frases, canções, poemas que falam de amigos incondicionais que nos tocam a alma profundamente.  E todos temos alguns que são aqueles irmãos que escolhemos. Em nossa caminhada pela vida, em diferentes situações contamos com essas pessoas que vibram e choram conosco. E nem o tempo nem a distância interferem nesse bem-querer. Sou afortunada, pois tenho muitos amigos, verdadeiros anjos de guarda, que velam e torcem por mim, independentes de idade e sexo. Entre eles, Sandra e Sérgio ocupam lugar especial. Assim, temos uns pelos outros o maior carinho e, mesmo à distância, nos “acompanhamos”, sem nunca perdermos o contato e a sintonia.
Caroline, filha do casal que conheci aprendendo as primeiras letras, casou-se hoje com Renato, numa cerimônia que me encantou pelo misto de simplicidade e sofisticação nos mínimos detalhes, pela organização ímpar, que a própria noiva teve o cuidado de encabeçar, deixando sua marca, a marca de uma jovem que sabe o que quer, mas que é, ao mesmo tempo, cheia daquela emoção que revela em cada toque.
A noite fria e chuvosa não empanou o brilho do ambiente e da cerimônia. Muito pelo contrário: o ar melancólico do tempo dava um toque mágico ao aroma das flores do campo. Uma tenda não muito grande abrigava os familiares elegantes e atentos a um grupo de violinos e vocais que entoava um repertório apropriado a cada instante do evento.
Um violinista recebia os convidados que, logo na entrada, eram aquecidos com um delicioso caldo quente. Acomodados, os convidados assistiram atentos a entrada dos pares que foram cuidadosamente organizados na sequência comum nestas situações: pais, padrinhos e noivos, com o destaque para os detalhes dos trajes femininos: todos nas cores  rosa, com várias nuances e matizes combinando com as flores que ornamentavam o recinto.
Homenagem especial às avós, que emocionou a todos. Foi delas o privilégio de abrir a cerimônia, mesmo com os passos trôpegos de uma delas. O destaque ficou por conta de um casal de crianças ‘‘noivinhos” que, ao som da música “Aquarela”, de Toquinho, entraram com um buquê de marshmallow e um enorme pirulito, relembrando a infância dos noivos e da maioria dos presentes. Uma nova surpresa completava o cortejo nupcial. Levava as alianças uma linda gueixa sorridente, vestida com um lindo e colorido quimono a homenagear a família dos noivos.

Ao som da Ave Maria e após a prece do Pai Nosso, os noivos trocaram as alianças e receberam as bênçãos de Deus através das vibrações dos familiares e amigos. Após os cumprimentos, todos retornamos ao local, agora já transformado com grandes mesas redondas decoradas lindamente com arranjos de flores rosa e bonsais onde seria servido o jantar.
Aperitivos, entrada, pratos variados, um atendimento impecável do serviço de bufê, alegria contagiante de todos impregnou o ambiente de uma atmosfera leve e emocionante. Estavam faltando os noivos, que deveriam retornar ao local para compartilhar com todos depois de muitos abraços e fotos. Aí o inusitado acontece.
Do alto da escada, os noivos, ela linda e sorridente, ele não menos lindo, com o  sorriso tímido comum aos orientais, traziam nos braços a MEG uma cadela Lhasa com uma tiarinha de pérolas e com um minúsculo véu entre as orelhas peludas. Foi emocionante. O amor incondicional que a família, e especialmente Caroline, tem pelos animais não poderia deixar a linda cadela de fora dessa ocasião tão especial, ela, que é companheira fiel em todos os momentos. Confesso que me emocionei, assim como todos os presentes. Após acompanhar o casal pelo salão, participando feliz, latindo e balançando o rabo, foi levada para casa. Afinal, o dia havia sido estressante para ela.

Mas a festa continuou e Caroline nos surpreendeu mais uma vez. Após o anúncio da valsa, os convidados dirigiram-se para um salão decorado onde começaria o baile. O baile? Sim mas como era dia de são Pedro, todos receberam seus chapéus de palha e dançaram muito... a quadrilha junina. Alegria geral.
Já era madrugada quando retornei a casa, sentindo um prazer enorme por ter feito parte de encontro tão especial e registrado tão belas cenas.
Aos noivos Caroline Renato, muitas felicidades.
Aos pais e grandes amigos Sandra e Sérgio, parabéns! Pelos filhos, por esse dia, e pela oportunidade do reencontro.

SBCAMPO   29/06/2013       





terça-feira, 18 de junho de 2013

VIAGEM SENSORIAL



Cai a noite tingindo de negro o espaço. Deitados, observamos o teto, rezando para que os olhos se acostumem à escuridão e nos permitam observar as réstias de luz produzidas pela lua crescente através das pequenas frestas da casa de madeira com telhado sem forro. O pisca-pisca das estrelas-vagalumes (ou dos vagalumes-estrelas) nos diverte e nos leva a imaginar viagens fantásticas no rabo de um cometa gigante.
Nossa mãe apaga a luz bruxuleante da lamparina a querosene para que possamos dormir. E ralha conosco, quando rimos das nossas brincadeiras ou damos abafados gritos com medo da assombração que, temos certeza, ronda a casa. São assim nossas lindas noites e, até que o sono nos domine, aproveitamos o tempo, que nos parece uma eternidade, num simplesmente fazer nada.
Nas noites chuvosas, nos agarramos com medo do clarão dos relâmpagos que riscam o céu e tapamos os ouvidos aguardando o ribombar dos trovões. Os galhos que roçam os telhados são para nós passos de bruxas (ou de uma mula sem cabeça que vem para nos assombrar). O que nos distrai nesses momentos é o coaxar dos sapos que fazem festas, comemorando a água em abundância, fundamental para eles.
Amanhece o dia. Felizes, observamos atentos a relva molhada, sentindo  o cheiro doce da terra lavada e a beleza das pétalas brancas e perfumadas do sabugueiro gigante que forram o chão, emoldurando o pequeno quintal, nosso recanto feliz. Recolhemos as mangas derrubadas pela ventania e nos deliciamos ali mesmo, arrancando com os dentes as cascas que envolvem a saborosa fruta. Nova manhã, sol brilhando, e não nos lembramos mais da tormenta.
Os anos passam.
A pequena casa, agora de tijolos, possui luz elétrica e água encanada. A rua sem asfalto, coberta de areia vermelha, passa ser o palco de nossas brincadeiras: pique-esconde, barra manteiga, Maria sai da lata, pula-corda e tantas outras formas de diversão que inventamos na hora e que nos entretêm até o cair da noite.
Em frente a uma vizinha rua da esquina, a estação de trem que, a cada partida de um comboio, nos dá a noção da hora com os longos apitos das marias-fumaças soltando faíscas pelos grandes narizes. No enorme pátio aos fundos do prédio principal, enormes composições fazem manobras e se abastecem.
Do outro lado da rua, um grande terreno, usado por uma empresa para armazenar os fardos de algodão antes de serem prensados e transportados para as indústrias distantes, é usado por nós como esconderijo nas brincadeiras. Entre as imensas pilhas nos encolhemos, escorregamos do alto e cutucamos as sacas para libertar as sementes das macias e brancas maçãs de algodão. O cheiro delicioso do ouro branco recém-colhido impregna nosso nariz e, misturado à poeira vermelha, nos faz espirrar e rir muito por isso. Às vezes aparece o vigia e nos dá um pega, fazendo-nos correr e, às gargalhadas, procurar outro abrigo.
A juventude chega.
Com ela, outras ambições, outros compromissos, outras histórias, mas o cheiro e o gosto da infância ficaram na lembrança. Agora o cuidado com os cabelos, o cheiro forte do perfume doce, a carícia dos vestidos rodados armados com anáguas rendadas que davam lindas formas à nossa silhueta, os sapatos de salto alto, os ternos para os meninos, o vai-vem na praça, os olhares atentos nos flertes, os bailes abrilhantados por famosas orquestras, os corpos colados rodopiando ao som dos boleros românticos, as cálidas carícias, palavras roucas ao pé do ouvido. Todos os sentidos em ação na vivência de momentos inesquecíveis. Momentos que se transformam em horas, dias, anos e...
A maturidade é inevitável.
A vida adulta na cidade grande nos remete a outras sensações. O barulho do ronco dos motores misturado ao som dos radinhos de pilha dos passageiros do ônibus lotado. A visão embaçada pela espessa fumaça, as mãos procurando apoio para o equilíbrio. O gosto ácido da responsabilidade misturado ao prazer da busca por um lugar ao sol. É assim que as lembranças vão sendo substituídas por outras que nascem agora tendo como cenário um mundo diferente não menos desejado.
Aos poucos, a adaptação. Com ela, outras belezas se incorporam ao cenário da passarela dos sonhos. Agora o trajeto tem outras cores: jardins floridos, bandeiras tremulando no alto dos prédios, cheiro suave das panificadoras, o apito atento do guarda de trânsito, o contato suave dos grossos agasalhos a nos proteger do frio intenso são coisas que fazem parte do cotidiano.
É a vida que pulsa dentro da gente, proporcionando uma existência feliz. Quando se percebe... O outono chegando, não cinza, mas de um verde-esperança, de um azul-céu de paz, um lilás de tranquilidade, um celeiro de energia e alegria de viver. Outros projetos, outros sonhos e o renascimento na busca da vida simples do interior. O retorno, não para a terra natal, mas para a muito charmosa e não menos querida Cidade Azul.
Por que essa escolha? Porque, das muitas fugidas da cidade grande nos feriados e nas férias, é Rio Claro a cidade escolhida: além do aconchego familiar, a tranquilidade e a beleza no seu jeito provinciano de ser. O jardim público com a charretinha levando as crianças para passeios e os carrinhos de pipoca e sorvete me trazem de volta o encanto da infância. A beleza da Floresta Estadual, com as ninféias perenes colorindo o lago, os aguapés lilases enchendo de magia o local.
Os ipês encantando as avenidas e o calor dos amigos que já fazem parte da minha vida influenciaram sobremaneira minha decisão de aqui viver. E o destino quis que a residência tivesse a sacada voltada para o pátio da velha estação de trem. E, para mais além no horizonte, o grande horto florestal faz rescindir o cheiro suave dos eucaliptos e serve de palco para revoadas de pássaros no cair das tardes. Isso sem contar o espetáculo do nascer do sol e de sua irmã lua. 
Mas... como nem tudo são flores em qualquer caminhada, minha cidade do coração também já não é a mesma. Cresceu, está com cara de cidade grande. Com lindos espaços de lazer e comércio muito desenvolvido, perdeu um pouco da sua timidez, mas continua aconchegante. O apito do trem que me fascinava na infância hoje fere meus tímpanos uma vez que as enormes locomotivas movidas a óleo diesel soam apitos estridentes e longos durante suas manobras.
Com os prós e os contras como qualquer cidade, São João Batista do Ribeirão Claro como era chamada no início nossa CIDADE AZUL, completa nessa semana 184 anos e os balões dirigíveis vão colorir ainda mais esse céu que é mais azul nessa aquarela brasileira.
comemoração do Dia da Cidade - balonismo

entardecer com chuva




luar






amanhecer

18-06-2013   - Fotos tiradas da sacada do meu AP

terça-feira, 14 de maio de 2013

NU ESPELHO




Uma gota d’água que escorre, de suor ou de lágrima lavando o rosto ou correndo na bica, o ribeirão que cantarola melodias da infância na fazenda,  hidrata a plantação e o coração que espera.  Essa é a mensagem que fica.
Solo fértil de desejos, dúvidas e incertezas, superação que a educação propicia, favorece o trabalho, amplia o conhecimento, fortalece a cidadania.
Honestidade e trabalho, economia e cooperação, superação dos problemas,  o caminho da construção. Como consequência, a inclusão.
Na pobreza, a solidariedade, na tempestade a família. Na angústia, o consolo da fé, na reflexão, a certeza. Na escalada e na perseverança, o exemplo, na dor a caridade, em tudo isso a verdade.
Com a experiência o amadurecimento, com a colheita a segurança, com dignidade, a conquista do porto seguro, a tranquilidade do futuro.
No outono, a colheita, da plantação o parto, do otimismo a coragem, da viagem a saudade dos amigos, a cooperação. No canteiro brota a vida curtida, sentida, bem vivida.

Oficina literária-  Geni  14-05-2013

terça-feira, 5 de março de 2013

A MULHER EM TODAS AS FASES




NOVA, no ventre escondida!
A semente rompe as comportas que deságuam empurrando-a para a vida.

CRESCENTE a esperança, a força e a coragem.
Depois da poda, renascem os brotos, surge a florada beijada pelo vento leve, delicado em sua breve passagem.

CHEIA, em sua plenitude, brilho e experiência
Oferece aos frutos o alimento do seu seio farto.
Inspira os poetas, chora, ama, se entrega na explosão do parto.
Colhe e reparte com muita arte.
Devolve à terra a semente que se
Desenvolve no solo úmido e quente.
Sem exigências, sem cobrança no amparo comovente,... A esperança somente.

Às vezes um mimo, outras tantas arrimo.
No frio do inverno a saudade, reminiscências, perdas
E, neste misto de alegria e dor,
Sente que o entusiasmo a invade.
Sonhos, esperanças, desencantos, ensinamentos, mas, sobretudo  alegria esfuziante,
Assim é a mulher em sua fase MINGUANTE 

Semana da Mulher - Março/2013

SEMANA DA MULHER


Sinal dos tempos?

Inversão de valores?

Para onde sopravam os ventos     
Que traziam tantos dissabores?

Foram longos anos de desencontros
De lutas por igualdade de direitos
Crescia o preconceito...

Novo milênio
Abrem-se horizontes
Ao invés do fogão, a mulher pilota o avião
A jovem linda e sedutora troca o tablado pelo senado
O mesmo general que exibe a farda anda as voltas com as fraldas
O empresário estressado, não raro, substitui o jornal pelo avental

Amélia é coisa do passado

Mulher e homem caminham lado a lado
Não importa a raça, cor ou idade...

CRESCE A SOLIDARIEDADE

Na escola da vida, juntos aprendem muito bem a conjugar o verbo  compartilhar



 

O POETA E A MULHER




Eterna fonte de inspiração, a mulher está presente em quase todas as canções.

Misturando sentimentos de amor, ódio, desejo e paixões,
Rondando as cidades, nos bares, nas alcovas, cometendo deslizes
É sempre ela que domina o pensamento e faz brotar poemas de todos os matizes.

Pra esquecer Luiza, o poeta a Maria Helena seu coração entregou.
Divina e graciosa é a Rosa, estátua majestosa, sempre cantada em verso e em prosa.

Enquanto Renata responde a Telma que esse não é seu papel,
Amélia, mulher de verdade, está hoje na praia com Maria Isabel.

 Severina vendeu a butique pra Das Dores, que só pensava em namorar
Conceição, que vivia no morro a sonhar com Dora,
Aquela rainha do frevo, inseparável de Luciana dos olhos de mar.

Marina morena na casa de Irene ouvia a canção para Yolanda, esperando a volta de Inês, que saíra deixando bilhete pra apagar o fogo.
 Dinorá, ansiosa, consolava Bárbara, que sofria por uma paixão doentia, recusando-se  ser como Aurora, que invariavelmente escondia o jogo.

Também Laura, menina de trança e sorriso de criança, rodopiava na sua dança a
Valsinha na ponta do pé.
Mas não conseguia como Emília, preparar um café.
Gabriela, que não pensava em nada, lavava roupa todo dia,
Sem alegria, que agonia.

Ana Julia, menina moça, perdeu o bem-querer para Madalena que,
Mirando-se nas mulheres de Atenas, não fez cenas.
Enquanto rainha dos detentos, Geni se fez um poço de bondade
Para o povo da cidade que a fazia chorar
E Carolina, na janela, muitas Marias viu passar.

Marias e Clarices, que às vezes se pegam a chorar,
Vivem a mulher equilibrista, que sabe que o show da vida não deve parar.

O poeta, homem sensível e, cheio de emoção,
Canta a mulher brasileira em primeiro lugar.
Com violão e, principalmente, coração.
 Geni 05/03/2013

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

NÚMERO 8


                              

Estava eu aproveitando a vista maravilhosa da sacada do meu apartamento para ver a tarde que caía, trazendo consigo a escuridão da noite. A lua, preguiçosa, fazia surgir dos picos dos pinheiros seus majestosos raios, como que nascendo por detrás do horto.

Em devaneio, pus-me a contar as primeiras estrelas que surgiam.   Meus pensamentos viajavam pelos caminhos do céu, quando percebi: as estrelas pareciam vaga-lumes, num interminável acende-e-apaga. Oras, então, como contá-las?

Pus-me então a pensar. Infinitas como as estrelas no céu são as maravilhas do mundo, que tão poucas conhecemos e, mesmo assim, tão pouco... E, apesar disso, como pode o homem  querer sempre ter o controle de tudo? E, afinal de contas, o que é o infinito?

“Não é dado a uma mente finita conhecer o infinito", está escrito. Se não podemos explicá-lo de maneira objetiva e clara, pelo menos podemos representá-lo por meio de uma forma criada pelo homem.

O símbolo o “oito deitado”, ou lemniscata, numa denominação mais científica, representa o infinito, a eternidade e o potencial divino. A imagem é conhecida desde a antiguidade e a razão de essa curva geométrica especial assumir tal significado é seu traço contínuo, uma forma sem começo nem fim.
(Se fizermos um traço vertical separando a forma ao meio, teremos, ou o ponto central), considerado o portal entre os dois mundos, o físico e o espiritual): um representa a jornada do nascimento até à morte; o outro, da morte ao novo nascimento. A dualidade sempre presente: bem e mal, profano e sagrado, forte e fraco, dificuldades e realizações, dores e prazeres.
Para os místicos, se quisermos encarar a vida de forma centrada, devemos sempre buscar o equilíbrio entre esses dois lados: o que representa o material através da busca dos prazeres imediatos, e o espiritual que transcende, e onde se buscam os valores da alma.
Eu gosto de pesquisar sobre numerologia e acho que têm sentido muitas das respostas que encontro. Tenho o número oito no meu destino. E já que somos número (CIC, RG, fone, CEP, passaporte, conta bancária, placa de carro, numero da casa, até número de rua, como em Rio Claro), acho chique ter um número com tamanho significado. Que bom.
Dizem que traçar o número oito no ar com incenso traz harmonia e energia para pessoas e ambientes. Não custa tentar, é só começar.

7-04-09



Ouro branco



Punhados de algodão formando nuvens ou pedaços de nuvens agarradas nos pequenos arbustos, tudo se confunde no grande tapete verde com arremates azuis, onde parece dar-se o encontro da terra com o céu.
Os pés de algodão enfileirados como soldadinhos em dia de festa formam desenhos geométricos na grande tapeçaria do campo, que mistura a cor branca das maçãs abertas com as flores rosa e com pequeninos botões verdes, que ficarão para a próxima colheita, para formar um cenário bonito para uma abertura de novela.
Os artistas são os catadores de algodão que, alheios a tudo, dão um colorido especial à tela com seus trajes improvisados: calças compridas com camisas de tecido rústico, lenço amarrado na cabeça também coberta com chapéu de palha de abas largas. Um saco grande de juta amarrado na cintura vai sendo arrastado e se torna cada vez mais pesado na medida em que vai sendo enchido com chumaços do algodão macio e de cheiro doce e agradável, o ouro branco.
No carreador[1] são depositados os bornais com a comida trazida de casa na marmita, que já estará fria na hora do rancho (daí o termo boia fria[2]). A moringa de barro, enterrada num buraco para manter a água fresca, fica só com o gargalo de fora.
A moçada cantarola para enfrentar a relva molhada e fria das manhãs e o sol escaldante das tardes do oeste paulista naquele mês de junho. São jovens sonhadores e cheios de saúde. Nada os deixa infelizes. O suor escorre abundante, as mãos feridas doem, mas ninguém se importa, pois todos querem ganhar as apostas: quem termina primeiro a rua[3], quem colhe mais rápido, quem canta melhor... E a tarde chega sem que se perceba.
Agora é só pesar o produto colhido, receber gaita[4] e esperar feliz o retorno na carroceria do grande caminhão. Ninguém se lembra de ter-se levantado às quatro horas da manhã e de que já lá se vão mais de 12 horas na labuta. 
Já é noite. O japonês[5] aposta corrida na estrada de terra vermelha e cheia de buracos e curvas. A poeira impregna todo o corpo e emaranha os cabelos. O corpo moído pelo cansaço e o sonho com um banho morno e uma cama limpa embalam o sono que chega e supera o desconforto dos solavancos do velho caminhão. Acotovelam-se todos para se protegerem do vento forte. O frio intenso corta os lábios e os olhos desprotegidos. Uns dormem, outros fazem piada, outros cantam as músicas caipiras que fazem a trilha sonora de mais um capítulo da novela “Os Boias Frias”[6]. O futuro? Só Deus sabe. Quando a safra acabar, talvez...


[1]Carreador. Caminho mais largo por onde passam as carretas que recolhem as sacas do algodão colhido.
[2])Boia. Comida.
[3]Rua. Espaço entre as fileiras de pés de algodão.
[4]Gaita. Dinheiro, remuneração pelo trabalho.
[5]Japonês. Motorista do caminhão.
[6]Boia fria. Pessoa não assalariada que presta serviço temporariamente e que come a comida fria no próprio local de trabalho.